26.5.08

A ervilha


In cards and flowers on your window,
Your friends all plead for you to stay.
Sometimes beginnings aren't so simple.
Sometimes goodbye's the only way.

(Shadow of the Day, Linkin Park)


Momento flashback: antestreia do filme Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal. Enquanto P. vai ao carro buscar os óculos de que se esqueceu, eu e F. tomamos vez na fila que se junta à porta da sala, pois não há lugares marcados. F., a grande responsável por eu ter voltado à vida boémia, põe-me a par das últimas. Não faço por mal, até porque se há alguém que gosto de ouvir é ela, mas a minha atenção é desviada para outro lado. À nossa frente, três amigos destoam do resto. Não que façam por isso ― são até bastante discretos, quer na postura, quer na indumentária ―, mas o meu radar deu sinal de alerta. E o que pode ter sido imperceptível para os demais, para mim foi suficientemente esclarecedor. Quando dou por mim, já estou a fazer uma coisa que detesto se for eu o visado: comecei a medi-los de alto a baixo. Acho até que um deles, o mais interessante por sinal, se apercebeu a dada altura. Disfarço. Para mais, não era a hora, tão pouco o local adequado. Termina o momento flashback.

Sábado à tarde. F. manda-me uma mensagem a perguntar se quero jantar com ela e o seu amigo A., que está de passagem por Lisboa. Insiste há dias para que eu conheça A., mas pelas estórias que me conta, sem esconder o entusiasmo e a admiração, eu tenho ficado de pé atrás… Não me agrada também que seja sempre ele a querer definir os horários e o lugar de encontro. Prefiro por isso deixá-los ir jantar primeiro e juntar-me a eles mais tarde.

Abrir parêntesis
A. foi namorado de F. quando andavam na universidade, mas conhecem-se desde que eram adolescentes e viviam os dois no Guarujá, litoral de São Paulo. Agora F. mudou-se para Lisboa e A. vive em Londres.
Fechar parêntesis

Chego ao restaurante já perto da meia-noite, acabaram as sobremesas, mas ainda decidem com que bebida vão encerrar o repasto. F., noto mal puxo uma cadeira para me sentar ao seu lado, está meio que perdida na mesa, onde, além de A., estão ainda mais três homens. Nenhum deles, para além de A., fala português. Bem sei que o inglês, apesar de todos os cursos que fez, não é o ponto forte de F., mas não me cheira que seja isso a incomodá-la. Reparo melhor no grupo. A., como imaginava, é o centro da mesa, só que não se comporta como o mulherengo “pintado” por F. Aliás, bastam-me uns minutos ali para perceber que F, apesar de já devidamente informada por amigos comuns do facto ― como me viria a confidenciar mais tarde ―, não estava era preparada para ver o seu ex-namorado, o mesmo que se lhe declarava timidamente desde os 15 anos, aos beijos com o seu namorado francês e cheio de trejeitos dengosos para com os restantes amigos. A., justiça lhe seja feita, além de bonito e elegante, é o tipo que só passa por gay quando assim o entende. Já os seus amigos e namorado são aquilo que podemos chamar de estereótipo: bonitos, jovens (um deles nem tanto, pois desconfio que beira os 50, mas em plena forma), bem sucedidos na indústria da moda e sem pudor de usar roupa totalmente justa aos corpos enxutos. Tiro-lhes o chapéu por não se preocuparem sequer em manter as aparências num dos restaurantes mais caros e chiques de Lisboa, mas sei também que muita daquela confiança em querer fazer com que o mundo os engula, além de deliberada, é fruto de um elixir poderoso chamado dinheiro. Acho graça também quando, num momento em F. se retira da mesa, A. começa a beijar o namorado ― para gáudio dos dois amigos ― para testar a minha reacção.

Vou com F. para o Bairro [Alto]. A. e os amigos ficam de nos encontrar lá. Claro que A. faz questão de sugerir o bar… Frequento o Bairro há mais de 15 anos, mas ainda assim continuo a perder-me nas suas vielas, já A., claro, chega tarde, mas não dá mostras de ter errado o caminho. Mal chega, pede uma rodada de caipirinhas para todos e, à parte, encomenda, suspeito, haxixe para ele e para o resto da pandilha. Quando os deixamos, já o bar é deles, mas, uma vez mais, eu e F. saímos à frente. P. espera-nos para irmos juntos até ao Lux.

A. e companhia ― juntaram-se, entretanto, mais dois gays ao grupo ― chegam já nós vamos no fim do primeiro copo. Foi parado no caminho pela polícia, mas, como sacana sortudo que é, “apenas” acusou 48 mg de álcool no sangue contra os 49 permitidos por lei! Apesar de o Lux ser, cada vez mais, gay friendly, o nosso grupo começa, aos poucos, a atrair alguns “satélites”, que ficam na órbita a ver onde param as modas. Pelo canto do olho, observo, entre o divertido e o desconcertado, que, à excepção de P. e F., somos todos praticamente da mesma altura, o que só serve para acentuar a ideia de “farinha do mesmo saco”. Claro que, estando os rapazes mais ou menos entretidos uns com os outros, tinha de sobrar para mim. Estou eu a dançar muito sossegado ― o sossegado é relativo, admito, mas adiante ― quando começo a sentir a presença incómoda de um tipo quase colado a mim. Se há coisa que me deixa “P” da vida é fazerem-me isto quando estou a dançar na minha. Chego-me mais a F., que sorri divertida, mas nem mesmo assim o tipo descola… Só penso: com tanto gajo bom aqui para escolher, este caramelo logo tinha de vir tentar a sua sorte comigo!!! Com o tempo, ele lá acaba por perceber e vai pescar ao largo. Não passam nem cinco minutos e já está de conversa com um outro na pista. Quando este se vira, a sua cara não me é estranha… Puxo pela memória e nem quero acreditar na coincidência: é um dos tipos que estava no cinema! Qual ovo qual quê, o mundo é uma ervilha!

19.5.08

A febre de sábado à noite


You could be from Venus
I could be from Mars
We would be together
Lovers forever
Care for each other

(Venus, Air)


Sábado. Princípio de noite às portas do Bairro [Alto]. Corre uma aragem fria, mas a lua plena, reparo agora, está pregada como uma jóia de prata no vestido de veludo preto sem mácula. Antes de começarmos a beber, precisamos comer qualquer coisa rápida. Àquela hora, os restaurantes e tascas estão todos a abarrotar, mais a mais, não é bem isso que nos apetece; sobretudo quando, ainda há dias, matámos as saudades dos filetes de polvo do Sinal Vermelho.

Depois de uma incursão falhada a uma das capelas do costume, assentamos arraiais no Vertigo. Gosto deste café ― e da sua clarabóia de vitrais, da mesa junto à janela, a minha preferida, das velas acesas dia e noite e de poder matar a fome, sem me preocupar se o horário é próprio ou não, com comidinhas simples e saborosas. Sinto-me bem ali, mas, depois do café, decidimos mudar de poiso. Ala que se faz tarde. Voltamos a cruzar a Brasileira, mas junto à Praça do Camões atalhamos pela Atalaia. Ainda espreito o Mexido, na Rua da Trombeta, mas é cedo e está às moscas. Na esquina com a Fiéis de Deus, ancoramos junto ao balcão do Majhong, meu porto conhecido de há muitos anos, mesmo que leve décadas a passar ao largo. Abrimos as hostilidades com Morangoskas e gin tónico. A conversa anima, junta-se mais um a nós e, a dada altura, já nem prestamos mais atenção se vagam ou não lugares sentados. Permanecemos de pé, a dançar a versão mais foleira de Tainted Love e a brindar ao que a vida tem de imprevisível e fortuito. De vez em quando, desligo da conversa e deixo-me hipnotizar, momentaneamente, pelos candeeiros verdes que pendem do tecto como alforrecas (águas-vivas).

Sacamos dos telemóveis aos primeiros sinais de mensagem. Marca-se novo ponto de encontro. Uma da manhã. Desaguam aos magotes nas ruas do Bairro e deixam-se ficar ao sabor das marés, mas nós nadamos contra a corrente até atingirmos os rápidos da Calçada do Combro. Sinto-me, cada vez mais, numa noite de resgate do que já fui, ainda que nem todas as portas me sejam familiares. Mas aquela, quase em São Bento, não demoro a reconhecer. No Incógnito fui feliz, mas era outra época, outras pessoas.

Organizamos as tropas à porta. Quando entro, num primeiro impacto, estranho as cores, mas a geografia da pista, afundada mais abaixo, é-me familiar. Por esta altura já emborquei dois gin tónicos e vou a caminho do terceiro. A noite é uma criança. Aos poucos, a pista vazia ganha vida, mas quando eu e mais alguns estávamos a começar a entrar no espírito, alguém se lembra de que aquilo já deu o que tinha a dar e que se impõe nova mudança. Há um náufrago a lamentar.

Distribuídos por vários táxis, rumamos, desta feita, para as vielas manhosas do Cais do Sodré, onde as putas e os marinheiros de água doce cederam, faz tempo, a vez aos que se dizem alternativos e avessos a lugares da moda. Agora, como antes, posso até parecer uma personagem deslocada naquele cenário de opereta bufa, mas sou capaz de desfiar o meu rosário de boas lembranças em praticamente cada um daqueles antros apertados e escuros. Infelizmente, o Tóquio está a rebentar pelas costuras, ainda é cedo para ir ao Jamaica ou ao Europa, por isso, meio que a contra-gosto, vou bater com os costados no Music Box. Lá dentro prefiro o vodka com energético ao charro (baseado), enrolado às escondidas, que vai passando de mão em mão. Africa is the future - pode-se ler no telão, mas, a partir de uma certa altura, a minha tolerância para com o som afro de batida tecno está quase a zero. Felizmente, lá pelas quatro e meia da manhã não sou o único a pensar a mesma coisa. Uns ficam, outros, como eu, batem em retirada e despedem-se à francesa.

Não falta muito para as cinco da matina, mas a fila para entrar no Lux não dá mostras de abrandar. Como sabemos o que a casa gasta não desesperamos. Dois suecos patuscos metem conversa, o que ajuda ainda mais a passar o tempo. Uma vez lá dentro, passamos uma revista rápida aos três ambientes da casa, mas não perdemos tempo a ir reclamar o que é nosso a um dos balcões. Por esta altura, já perdi a conta ao que bebi, mas como o corpo continua a não acusar o toque, não vejo por que parar. A desproporção entre homens e mulheres salta à vista desarmada, com a clara predominância dos primeiros, mas ninguém parece importar-se muito. Eu muito menos.

A nossa propensão para morcegos, leva-nos a preferir o som da pista no porão. Às seis e meia, os meus pés dão o primeiro aviso de que não tardo a virar abóbora, mas continuamos a dançar ― e a beber ― até quase ao fecho. Saímos para a rua já passa das sete. Os vampiros mais batidos nestas andanças trazem postos os óculos escuros, evitando assim cegar com os primeiros, e cruéis, raios de claridade. Depressa desistimos da ideia peregrina de ir tomar o pequeno-almoço. Aterro na minha cama pouco depois das oito. Dormirei nem quatro horas seguidas. Porque hoje como ontem, por mais que os anos tenham passado e eu seja um homem feito há muito, uma noitada não é desculpa para não estar presente à mesa, com os meus pais, no almoço de domingo.

12.5.08

A imagem

Fotografia de Zsolt Szigetvàry, Hungria

Ontem, domingo, aproveitei a tarde para cumprir um ritual que, na medida do possível, tento preservar ano após ano: fui ver a exposição da World Press, que distingue as fotografias mais marcantes, a nível mundial, em diversas categorias. Poderia falar de muitas delas, mas esta aqui marcou-me por razões que, acho, dispensam maiores explicações da minha parte; acrescento apenas um breve enquadramento para quem ainda não viu e/ou não terá oportunidade de o fazer: estes dois homens estão à espera de ser socorridos. Um deles foi atingido na cabeça por uma pedrada. O agressor, provavelmente um manifestante neonazi, fê-lo porque estes dois mesmos homens participavam na Parada de Orgulho Gay em Budapeste, que teve lugar em Julho de 2007. E eu que, ainda há um ano, me arrepiava com a ideia de tais desfiles de duvidoso gosto e não conseguia enxergar para lá das plumas e das figuras tristes, hoje olho para alguns destes homens e mulheres - sobretudo os que não perdem a dignidade nem debaixo de pedrada - e compreendo-os muito melhor.

Em rodapé desta vez, uma velha música dos Portishead, Roads, que, volta e meia, reaparece para me assombrar. Porque Ohh, can't anybody see / We've got a war to fight / Never found our way / Regardless of what they say.

6.5.08

O anzol


Ai eu já pensei mandar pintar o céu
Em tons de azul, pra ser original
Só depois notei que azul já ele é
Houve alguém que teve ideia igual

Eu não sei se hei-de fugir
Ou morder o anzol
Já não há nada de novo aqui
Debaixo do sol

(
O Anzol, Rádio Macau)


Quantos gestos banais, e até mesmo irreflectidos, não nos passariam totalmente ao lado não fosse o facto de terceiros reparem neles e com isso nos obrigarem a pensar no que acabámos de fazer quando não era de todo essa a nossa intenção?

Deixem-me explicar. Estava eu a saborear um cappuccino, a conversa e a esplanada quando, sem o mínimo desígnio obscuro, estendi a minha perna direita, servindo-me da cadeira vaga em frente como apoio. Não será o tipo de coisa que faça muito frequentemente em público, mas naquela tarde amena, depois de andar a caminhar desde cedo, apeteceu-me e fi-lo espontaneamente. O curioso é que, não fosse esse gesto e, provavelmente, os dois homens da mesa ao lado da nossa ter-me-iam passado despercebidos. Para um deles, porém, o eu ter colocado a minha perna esticada sobre uma cadeira deve ter funcionado como pretexto, pois, de repente, senti-me observado. Encarei-os por breves segundos – o suficiente para constatar que as mesas estavam muito mais próximas do que imaginara e que um dos homens de meia-idade me fintava agora sem cerimónias. Desviei o olhar e continuei a falar com o meu amigo, mas, porque tinha clara noção de que continuava a ser observado, já não fui capaz de manter a mesma posição por muito mais tempo. A dada altura, e porque os nossos olhares se voltaram a cruzar inadvertidamente, o homem aproveitou para me atirar à queima-roupa:

- Are you Brazilian? – E ficou a sorrir, como que expectante da resposta que julgava ser óbvia.

Numa cidade onde não faltam imigrantes portugueses, e por isso o português se faz ouvir um pouco por todo o lado, não deixou de me parecer uma ironia – mas ainda assim previsível - que aquele homem, que estivera claramente a matutar numa maneira de meter conversa connosco, optasse por nos atribuir uma nacionalidade que, a avaliar pelo riso matreiro, lhe despertava maiores fantasias do que nos imaginar tão portugueses como o homem do táxi ou a mulher que lhes limpa a casa.

Desfeito o equívoco, e terminada a troca de palavras de circunstância que parecia ter por único propósito saber o que estávamos a fazer na cidade, reparei que o meu amigo, à excepção de ter rosnado entre dentes “Panilas”, se havia mantido à margem durante o curto diálogo – a típica reacção de defesa dos homens hetero quando, em desvantagem ou igualdade numérica, se sentem na mira de homens gays.

Mas eu, que gosto de divagar sobre banalidades, fiquei pensativo. Primeiro sobre a nossa linguagem corporal e como ela pode, de facto, condicionar/influenciar a forma como os outros nos vêem. Segundo a questão dos estereótipos e como estes podem ser enganadores – será que devo tomar como elogio, e já agora os que são realmente brasileiros, o facto de ser confundido com um brasileiro quando isso vem associado a uma certa imagem feita de “exotismo” e “sexualidade”? Terceiro, não é a primeira vez que sou abordado por um casal gay mais velho e, muito curioso, o padrão, de certa forma, repete-se: há sempre um que toma a iniciativa de meter conversa enquanto o outro permanece silencioso, o que me deixa na dúvida se está em sintonia, e apenas é mais tímido, ou se a situação, na verdade, o incomoda, mas opta por não interferir? E o que significa a abordagem? Estão apenas a ser simpáticos? Gostam de fazer novas amizades? Ou nada disto é assim tão inocente – como eu realmente suspeito - e é apenas um subterfúgio para tentar a sorte? E se assim o for, o que os levou a arriscar? O facto de sermos dois homens adultos sozinhos numa esplanada a meio da tarde? Estender a perna é algum código que deva saber para evitar mal-entendidos futuros (okay, esta até a mim me parece estapafúrdia, mas não custa perguntar! hahahahah) ? Ou ser brasileiro – e vocês que o são, respondam-me, por favor – tornou-se efectivamente sinónimo de “gente muito disposta” no estrangeiro (estou a ser mauzinho, mas vocês percebem onde quero chegar, right)? E estariam os senhores a pensar num ménage a quantas mãos (e pernas, pois então, hahahahahaha)? - admito, esta última foi só para lançar a confusão!

Dá que pensar, ou sou eu que ando a ver muitos filmes? (não precisam responder!)

1.5.08

Apaguem as luzes, por favor, que me dói a cabeça...

Image by Oz


I hope all my days
Will be lit by your face
I hope all the years
Will hold tight our promises

I don't wanna be old and sleep alone
An empty house is not a home
I don't wanna be old and feel afraid

And if I need anything at all

I need a place
That's hidden in the deep
Where lonely angels sing you to your sleep
Though all the world is broken

I need a place
Where I can make my bed
A lover's lap where I can lay my head
Cos’ now the room is spinning
The day's beginning

(Atlantic, Keane)


Dois homens away from home. O dia vai longo - entre aviões, comboios, táxis, malas abertas. Uma nova geografia com sotaques arrevesados pelo meio. O reencontro pede uma cerveja no bar-da-esquina-onde-todos-vão. Bebemos a primeira, mas, já que estamos ali, e o final de tarde até está agradável, pedimos outra… A conversa engata. E está tão boa que, apesar do câmbio desfavorável, pedimos a terceira para a saída. O crepúsculo tarda, mas o relógio diz-nos ser hora de jantar. Mudamos de poiso. A falta de inspiração para procurar mais adiante dita um restaurante italiano de ocasião, do qual não vou nem recordar o nome mais tarde. Bebemos mais duas para o caminho. Chegados ao hotel, o alpendre do meu quarto, virado para o lago adormecido, exige, apesar da brisa fresca dessa noite, um brinde com vinho. Vazamos a primeira garrafa de tinto e não demora muito a ficarmos amigos de infância. Começam as confissões, algumas das quais serão convenientemente esquecidas na manhã seguinte. Noto que ele se controla, a muito custo, para não tropeçar na língua. Já eu estou mais preocupado em não tropeçar nos pés quando me levanto para ir mijar. Na volta, trago mais uma garrafa.

Terminamos na cama. Cada um na sua e com a respectiva ressaca por companhia. Em momento algum, mesmo quando a conversa resvalou para zonas de perigo, achei que o desfecho pudesse ser outro. Tanto para mim – tenho mais ou menos claro que não me quero envolver com colegas de trabalho -, como para ele – casado, e bem casado até onde sei ou me interessou saber -, o estímulo esteve sempre, e só, em deixar as coisas avançarem até aquele ponto crítico em que a corda fica esticada no limite da tensão. É um desafio. Um jogo em que muitos homens se exercitam sem nunca saírem da sua esfera de conforto ou sem terem de pôr em causa seja o que for. Pouco para uns. Para outros é o suficiente. No meu caso, tem sido, na maior parte das vezes, o bastante. Resta a quem o faz ter a inteligência, e a humildade, de ter sempre bem presente uma lei elementar da vida: o vazio prevalece sobre tudo aquilo que é fugaz.