2.12.07

A três


But can you save me
Come on and save me
If you could save me
From the ranks of the freaks
Who suspect they could never love anyone

(Save Me,
Aimée Mann)


Chego à hora marcada com um embrulho e uma caixa dos chocolates que ela tanto gosta. Ele já está em mangas de camisa, a cozinhar para nós. Só o vi uma única vez, há uns bons anos, e ainda assim de raspão. Nem me recordo ao certo da sua cara, mas ela insiste sempre em dizer-me ― suponho que também o faça com ele ― que somos parecidos em muitas coisas, por isso, nessa noite, seremos três. Ele estende-me a primeira garrafa de vinho para eu abrir, ela pede-me para ajudá-la a pôr a mesa. Três cadeiras, três pratos, três copos, três velas. Não deixa de ser irónico, penso. A casa ainda está muito vazia, mas, na aparelhagem, toca sem parar Aimée Mann ― é inevitável recordarmos o filme Magnólia. É só mais uma das (muitas) coisas que temos em comum, por isso, e já um pouco bebidos, brindamos à nossa inabilidade para lidar com as coisas do coração. Da mesa passamos para o sofá. Ele prefere ficar sentado no chão, apoiado numa almofada. A conversa solta-se na mesma proporção que vamos esvaziando as garrafas de vinho. Às tantas, ele estende-me um charro (baseado). Recuso, ela aceita dar uma passa. A cena nunca aconteceu ― não entre nós, pelo menos ―, mas soa-me a dejá vu. No final da noite, a minha intuição confirma-se. Nada é dito, nada é sequer sugerido ou insinuado, mas fico com a quase certeza de que ele, tal como eu, está condenado a ser o seu melhor amigo para sempre. Saio de lá a perguntar-me até que ponto, ela tem consciência de que nós os dois, os homens da sua vida, somos realmente parecidos…

14 comentários:

Latinha disse...

Isso me lembrou um amigo que eu tenho, nos conhecemos através de amigos em comum e acabou nascendo uma grande amizade.

Por diversas vezes fiquei hospedado com sua família, apesar da grande amizade nunca tinhamos sentados para conversar mais profundamente sobre relacionamentos.

A pouco tempo descobri que tinhamos muito mais em comum do pensavamos.

Grande abraço meu amigo!!!
Boa semana!

Paulo Mamedes disse...

Nossa que texto misterioso... heheh, mas adorei o jeito que vc o leva até o fim, não pulei nem uma palavrinha...rs

Anónimo disse...

Pode colocar mais água no feijão porque seremos 4 (não Éramos Seis?): magnólia é muuuuuito bom e a música é uma verdadeira personagem da película. Adoro. Beijo!

Manuel Braga Serrano disse...

óptimas passagens apenas com a sugestão... o não-dito tem sempre mais força...

Goiano disse...

moço se o amigo secreto vingar
te quero nele
ja vou avisando!

Alberto Pereira Jr. disse...

muitas vezes não percebemos que a felicidade está ao nosso lado.. ou se percebemos não arriscamos, preferimos o marasmo conhecido ao desafio do novo...

lindo e emocionante relato

João Roque disse...

Estou com o Manuel
há coisas que se dizem sem se dizer...e mais não digo!
Abraço aos "dois".

Anónimo disse...

Cada relato que a gente lê... Olha isto: http://portrasdoespelho.blogspot.com/

:-)

Anónimo disse...

Uhnnnn,

Tudo isso não tem nada haver comigo, seus escritos cada vez parecem mais com os livros que eu não leio.

Te adoro!

Beijos!

FOXX disse...

demorou mas te achei né?




¬¬



será q ela já naum percebeu e finge q naum?

Râzi disse...

Oi, meu padeiro do coração!!!

Essas coisas de sentimentos não correspondidos são histórias maravilhosas! A tensão é sempre presente e quase palpável!!

Beijão, lindo! :D

E gente, sim, o padeiro é Lindo! hauahauhuhuahau! E o Lê não fica com ciúmes porque gosta muito dele, e também acha! :p

Anónimo disse...

O filme Magnólia e a respectiva banda sonora são das melhores coisas que se podem partilhar. Abraço!

Will disse...

Esses jantares são um perigo...

Anónimo disse...

Vim conferir pela indicação do Megafashion. Em poucas palavras ( muito ficariam num blá-blá-blá só) um momento e sentimentos poeticamente descritos. Parabéns!

http://blairponjinha.blog.uol.com.br/