Here comes Johnny Yen again
With the liquor and drugs
And a flesh machine
He's gonna do another strip tease
(Lust for Life, Iggy Pop)
Não sou propriamente do contra, mas desde criança que o meu pai me avaliou e apontou um desvio de carácter perturbante: eu faço a linha anti-herói. Quer isto dizer que eu muito raramente me comovo, na ficção como na realidade, com o herói que, de tão bonzinho e bem-intencionado, me provoca bocejos. Chamem-me descrente, quiçá insensível, mas gente muito boazinha nunca me convenceu; antes me deixa com os nervos em franja e de pé atrás.
É mais forte do que eu. Gosto de pequenos defeitos. Gosto de imperfeições. E gosto de quem assume as suas fraquezas sem lamechices. Talvez por isso o meu coração sempre bata mais forte por todo o sem-vergonha que pode até se esquecer de ajudar a velhinha a atravessar a rua, que não poupa nada nem ninguém às suas tiradas secas e cínicas ou que se está a lixar para ganhar o céu em vida, mas ainda assim, quando ninguém está a ver, é capaz de tirar a camisa para a dar alguém em apuros.
Não confundam as coisas. A minha predilecção por bad boys nada tem a ver com ser amoral ou totalmente desprovido de ética e decência. Tal como não tem a ver com o tipo canalha-pé-de-chinelo. Eu sou mais o irresistível patife, bon vivant de sorriso matreiro, que gosta do que vê quando se olha ao espelho e não sente remorsos em desfrutar do bom e do melhor. Sempre em grande estilo. De preferência metido num bom fato (terno) italiano.
Agora vem a parte pior. De pouco me adianta esta identificação. De nada me serve colocar ali, no canto superior esquerdo do blogue, a imagem de um anjo negro. Como arremesso de bad boy eu deixo muito a desejar e ninguém me leva sério por mais que eu bata o tacão da minha bota-mata-baratas e afine a mira do meu olhar-calibre-33. Quase me resignei à minha triste sina de bom rapaz, no melhor estilo o neto-que-toda-a-avó-gostaria-de-ter ou o genro-que-toda-a-sogra-pediu-a-Deus. Fazer o quê? A sentença saiu e vaticinou que eu faço o género para-casar; logo eu que queria antes ser o motel e não a casa com cerca branca e jardim.
É o descrédito total – podem rir, eu mesmo estou a gargalhar!
Aliás, por este caminho, e se ainda se espalha que eu gosto de flores, de animais e de criancinhas, não tardará muito a ter alguém a pedir-me para ser o pai do seu bebé – o que me vale é que não tenho amigas assim tão modernas e/ou desesperadas. Nem distraídas, pois, convenhamos, a avaliar o que gasto em roupas e outras futilidades que tais, não sou exactamente um poupa-níqueis-para-mais-tarde-garantir-o-futuro-do-fedelho de fiar (ops, shame on me!).
Mas já que da fama de bom rapaz não me livro, resta-me esperar que, tal como os homens preferem as louras mas escolhem as morenas para casar, os outros homens se queiram apenas divertir com os bad boys. É que os ditos bons rapazes c0mo eu podem até nunca conseguir, por muito que ensaiem poses e trejeitos, cultivar o mistério, o gingado ou o olhar-atravessa-paredes do bad boy, mas, em compensação, ao mostrarem maior disponibilidade para enxergar para lá do próprio umbigo, e se forem suficientemente espertos, depressa ficam com um trunfo escondido na manga: saciada a primeira vontade, o que sustém a tesão – e tudo o que se lhe segue – não é a imprevisibilidade, mas precisamente saber de antemão com o que se conta na hora H.