Coming out of my cage
And I've been doing just fine
Gotta gotta be down
Because I want it all
It started out with a kiss
How did it end up like this?
It was only a kiss
It was only a kiss
(Mr. Brightside, The Killers)
De toda a forma, este é, queira eu ou não, goste eu ou não, um momento de reflexão; com a vida em suspenso, assim me parece, dei por mim a deitar contas à dita e a chegar a algumas conclusões interessantes.
Desde já aviso: valem o que valem. Não são, nem quero que sejam, verdades absolutas. Têm prazo de validade e prestam-se a ser contrariadas. Ao fim e ao cabo, mais do que ressacas e doses homéricas de boa disposição impingida, quando não mesmo simulada, o conceito de Réveillon serve, valha-nos ao menos isso, para manter acesa a ilusão de que nos é sempre possível recomeçar, emendar a mão, corrigir a trajectória. E essa ideia agrada-me.
Vamos então para 2009 e quem for o último da fila, por favor, que feche a porta.
1. Preciso ser mais caloroso com os meus amigos. Aliás, preciso ser mais caloroso de uma forma geral, o que não quer de todo dizer que vá andar por ai a distribuir beijos e abraços a torto e a direito. Apenas constatei que há coisas que precisam ser ditas e não apenas demonstradas.
2. Preciso controlar os acessos de raiva. Não me fica bem perder a calma, já para não falar no aprumo e na compostura. Contar até dez ou respirar fundo antes de explodir são receitas antigas que ainda funcionam. Permitir-me-ei, de quando em vez, e só para não perder a graça e o charme, uma ou outra birra, um ou outro amuo.
3. Preciso dar ordem às coisas. Rejeitei o amante, mas esforço-me para conservar o amigo... faz realmente sentido? Os fins justificam os meios, ao ponto de andar a "cozinhar em lume brando" alguém que ainda não percebi se quero como amigo ou como amante? Vale a pena continuar a insistir na ideia do amante, só para não morrer estúpido, ou teria mais juízo se me ficasse, de uma vez por todas, com o amigo? O que me leva a não colocar um ponto final numa situação que está, ao que tudo indica, para lá dos meus limites?
4. Não preciso de resposta para tudo. Da mesma forma que nunca me senti inteiramente hetero, é bastante provável que nunca me venha a sentir um gay de corpo inteiro. Não é uma questão de proporção. Não dá para quantificar ou medir. Mas não é um drama. Não é uma fatalidade. Tão pouco é uma maldição. A vida não é a preto e branco e eu tenho de aprender a viver com as (minhas) nuances.
5. Preciso ser mais objectivo. Rala-me o preconceito dos outros, mas ainda lhe estou imune porque, na verdade, em vez de me colocar na pele dos visados, eu mantenho-me a uma distância segura e tudo observo de fora. Logo, o preconceito é também meu.
6. Não preciso de aprovação, mas quero respeito. A minha "luta" nunca passará por os outros me aceitarem ou não como sou. Não preciso de aprovação; precisarei que me respeitem, antes de tudo mais, para que, de futuro, não venha a sentir-me forçado a justificar ou a fazer da minha sexualidade um rótulo.
7. Preciso dar a mão à palmatória. Ao contrário do que sempre imaginei, as probabilidades de me vir a envolver - pelo menos nos tempos mais próximos - com tipos da minha idade são ínfimas. Demorou, mas percebi que jogamos em campeonatos distintos.
8. Não preciso de fag hags no meu eixo de gravitação. Tenho uma relação bastante cúmplice com as mulheres da minha vida. Gosto de as ter por perto e de as ouvir. Gosto de saber que, mais do que confiarem apenas em mim, confiam no meu discernimento. Mas que nenhuma delas, no dia em que a minha sexualidade deixar de ser nebulosa, caia no supremo disparate de querer fazer de mim uma alcoviteira ou o seu "homem de mão". Trocar cromos (figurinhas, para quem não sabe o que são cromos) de marmanjos ou galar o galalau na mesa ao lado não fazem, definitivamente, parte das coisas que quero partilhar com elas.
9. Preciso ganhar mais dinheiro. Até sei viver sem ele, mas a minha vida fica tão mais divertida quando não tenho de andar a equilibrar-me no arame. Não ligo a dinheiro, mas ligo muito a tudo de bom que ele compra e me proporciona. I'm a material boy, mas o meu interior também é bonito. Podem espreitar.
10. Não preciso de yesmen nem de gueixas. Há quem goste de ter alguém a seus pés e pronto a dizer que sim a tudo e a reclinar-se ao menor estalar de dedos. Não é para mim. Gosto de quem me dá luta. De quem me desafia. De quem, em doses saudáveis, mantém uma certa dose de perversidade e imprevisibilidade. Gosto de encurralar o adversário na parede, mas também aprecio um igual que, na luta corpo a corpo, me saiba tirar o tapete. Uma mão lava a outra e as duas juntas formam um braço de ferro.